Alice no País das Maravilhas
Chato, previsível e visualmente excessivo

Eu ia começar este texto falando que Tim Burton é um dos diretores americanos mais singulares da atualidade, dono de uma visão particular e sombria, blá, blá. Mas, quer saber, que se dane.

A bem da verdade é que Burton, ao longo de uma carreira cinematográfica de mais ou menos 22 anos, se notabilizou não só por seu modo cavernoso de ver o mundo, mas também por realizar filmes fantásticos (não o gênero, mas a qualidade) paralelamente a porcarias de alto orçamento.

Temos então o cineasta criativo de Os Fantasmas Se Divertem e Sweeney Todd, o sensível de Edward Mãos e Tesoura, Ed Wood e Peixe Grande e, por não achar um termo mais adequado, o equivocado de Batman - O Retorno, Marte Ataca!, A Lenda do Cavaleiro Sem Cabeça e Planeta dos Macacos.

E é justamente neste último adjetivo que se encaixa seu mais novo filme, Alice no País das Maravilhas.

Visualmente impressionante, mas claramente excessivo, Alice... começa mostrando a jovem protagonista, agora com 19 anos, submersa nas intrigas da sociedade da Inglaterra Vitoriana, sendo, inclusive, forçada a aceitar ao inesperado pedido de casamento de um lorde afetado.

Inconformada com a direção que a sua vida tomou e sentindo muito a falta de seu pai, Alice tenta fugir de sua realidade e acaba retornando ao mundo de fantasia que acreditava sonhar quando criança.

É curioso notar como Burton trabalhou com certa seriedade a reconstituição de época desse início do filme, que remete a produções inglesas como Vestígios do Dia e Razão e Sensibilidade - realmente, uma boa surpresa.

Depois que Alice cai na toca do coelho, entramos devidamente no território fantástico que o diretor tanto adora. Mas o resultado não é dos melhores.

Profundidade de um pires - Assim como em A Fantástica Fábrica de Chocolate, Burton dá uma roupagem mais moderna e complexa a um clássico, mas se esquece completamente do elemento mais essencial para uma adaptação infanto-juvenil: a emoção.

Tudo soa plástico, sem profundidade. Os personagens mais bem trabalhados, como o Chapeleiro Louco de Johnny Depp, não passam de meras caricaturas. E os coadjuvantes parecem saídos de um desenho animado qualquer da Disney - animaizinhos falantes tão estilizados que perdem feio para os de Crônicas de Nárnia.

Até o 3D incomoda. Fora algumas cenas realmente espetaculares, como quando Alice encolhe até se perder no próprio vestido, o excesso de elementos dá a impressão de um livro de recortes, com colagens bidimensionais se sobrepondo sobre as páginas - o que, por si só, já é controverso.

O roteiro é outro problema. Previsível, chato e conduzido para ter cenas e mais cenas com elementos para serem destacados na "nova" tecnologia. Não vemos Alice evoluindo da surpresa incial para a aceitação dessa nova realidade e depois para a constatação de seu real papel nesse mundo. Isso simplesmente acontece, num estalo.

Restam os destaques da australiana Mia Wasikowska no papel principal, que tenta dar dignidade à personagem, e da mulher do diretor, Helena Bonham Carter, roubando a cena como a cabeçuda e pirada Rainha Vermelha - parece que as única que levaram a sério seus personagens.

O Chapeleiro Frodo - Já Depp decepciona como o Chapeleiro Louco - desde já, mais uma de suas interpretações vazias, como Willie Wonka, de A Fantástica Fábrica de Chocolate, e o investigador Ichabod Crane, de A lenda do Cavaleiro Sem Cabeça.

Parece até que o ator gostou tanto de ter se baseado em Kieth Richards para criar Jack Sparrow, em Piratas do Caribe, que usou a mesma técnica para desenvolver o Chapeleiro, usando agora o ator Elijah Wood como modelo - em alguns momentos, a impressão é que estamos diante do hobbit Frodo, de O Senhor dos Anéis.

Não só os olhos, os dentes separados e a expressão facial, mas todos os trejeitos do personagem imortalizado por Wood foram assimilados por Depp - é incrível, mas não deixa de soar como zombaria.

Por fim, apesar de ser o filme mais lucrativo da história de Burton, Alice no País das Maravilhas não deve faturar tanto quanto se imagina nas bilheterias brasileiras - principalmente porque temos filmes com apelo mais popular em cartaz e por não estarmos no período de férias escolares.

E, no final das contas, a decisão da distribuidora de estrear o filme no Brasil um mês e meio depois de seu lançamento nos EUA parece ter sido a mais acertada.

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